Vai sobrar floresta para contar história


Os primeiros dias de junho já entraram no calendário como a Semana do Meio Ambiente, período em que assistimos em 2016 no mundo todo, uma série de ações que se propõem a comemorar a data, divulgar informações sobre o tema e envolver a sociedade na mobilização por um ambiente melhor para todos. Aqui no Brasil essa semana ainda ganha um aspecto especial, pois é precedida pelo Dia Nacional da Mata Atlântica (27 de maio), quando divulgamos os dados do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, iniciativa que monitora o desmatamento do bioma há 30 anos. O estudo é desenvolvido pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com patrocínio de Bradesco Cartões e execução técnica da empresa de geotecnologia Arcplan.
É importante que essa seja uma data de comemorações, sem dúvida. Mas infelizmente as notícias que temos para apresentar sobre esse bioma não são sempre positivas. Entre 2014 e 2015 o estudo identificou o desmatamento de 18.433 hectares (ha), ou 184 Km², de perda de remanescentes florestais nos 17 Estados da Mata Atlântica. Para se ter uma ideia das dimensões desse número, a área equivale a cerca de 18 mil campos de futebol. Comparado ao período anterior, entre 2013 e 2014, as taxas de desmatamento aumentaram 1%, após queda de 24% no período anterior. Neste cenário, se pensarmos que hoje só existem 16 milhões de hectares (12,5%) do que um dia foi Mata Atlântica, qualquer desmatamento é inaceitável.
Originalmente, a Mata Atlântica cobria mais de 131 milhões de hectares do território nacional. Para saber quais são os 17 Estados inseridos no bioma, basta pensarmos naqueles que são banhados pelo Oceano Atlântico, do Rio Grande do Sul ao Ceará, e incluir Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás e Piauí, onde a Mata Atlântica avança continente adentro.
E o que aconteceu para que a devastação do bioma tomasse tamanhas proporções, tornando-o o mais ameaçado do país? A resposta está na própria história do Brasil. Desde o início da colonização, em 1500, passando por todos os ciclos econômicos, da cana-de-açúcar à industrialização, a história do desenvolvimento do país é também a história da destruição da Mata Atlântica.
Quando iniciamos o monitoramento do bioma em 1990, sabíamos dessa relação entre desenvolvimento e desmatamento, mas pensávamos também que essa era uma questão que tinha ficado no passado. Engano nosso. O primeiro levantamento que analisou dados referentes ao período entre 1985 e 1990, nos mostrou que a destruição da floresta ainda acontecia de maneira espantosa e que era preciso medidas urgentes para contê-la.
De lá para cá, muito foi feito nesse sentido, com um amplo trabalho de mobilização da sociedade e com a criação de marcos regulatórios para a proteção da floresta. Destaque para a Lei da Mata Atlântica, promulgada em 2006 depois de 15 anos de tramitação no Congresso Nacional.
Dos 1.887 milhões de hectares que foram desmatados nesses 30 anos de monitoramento, 78% ocorreu entre 1985 e 2000. A partir disso, entramos num período de consecutivas quedas. Muitos Estados, inclusive, já estão no nível do desmatamento zero, quando a supressão da vegetação nativa não ultrapassa 1 km2, só que não podemos descuidar. Também não basta contermos a destruição da floresta, agora é a hora de recuperar o que perdemos.
A SOS Mata Atlântica tem investido nesse desafio. Nossos programas de restauração florestal plantaram 36 milhões de mudas que recuperaram 21 mil hectares, uma área equivalente à cidade de Recife. Mas esta é apenas uma pequena contribuição.
Somos 145 milhões de brasileiros que habitam os 3.429 municípios inseridos no bioma, alguns deles os maiores e mais populosos do país, como São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador. Moramos na Mata Atlântica e dependemos dos serviços por ela prestados como a regulação do clima, a qualidade do ar, a geração, o abastecimento de água e o fornecimento de recursos para o desenvolvimento das atividades econômicas. Portanto, o desafio é coletivo. Do mesmo modo como nossa história se confunde com a da Mata Atlântica, nosso futuro também depende dela. 

Fonte: Marcia Hirota e Flávio Jorge Ponzoni

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