Que sustentabilidade queremos


Em geral, a ideia de sustentabilidade de um sistema qualquer nos remete a um princípio de retroalimentação, que garanta a manutenção e a evolução contínua do próprio sistema. Durante séculos, não foram poucos os inventores e homens de ciências que se ocuparam em tentar demonstrar a existência de um perpetuum mobile, ou moto contínuo. Sempre sem sucesso. De fato, as leis da Termodinâmica impedem a existência destas máquinas “mágicas”. No mundo real há sempre perdas (atritos, por exemplo) e, eventualmente, ganhos se o sistema não for isolado. Ora, se desejamos pensar nos critérios que devem definir o que é a sustentabilidade global do planeta a primeira coisa sobre a qual nos daremos conta será a complexidade e a variedade das atividades humanas de exploração, produção e de transformação. Qualquer tentativa nesse sentido deve ter um foco bem claro.
A noção de sustentabilidade que frequentemente baliza decisões políticas, sejam ambientais ou econômicas, costuma estar fundamentada no Brundtland Report, de 1987, também chamado de “Our Common Future”. Nesse documento define-se, em linhas gerais, o desenvolvimento sustentável como sendo aquele capaz de satisfazer nossas necessidades atuais, sem tolher das futuras gerações a possibilidade de que venham a continuar podendo satisfazer as suas necessidades.
Os autores Goodland e Daly sustentam que para se construir um conceito de sustentabilidade mais apropriado para guiar futuras decisões sobre o aproveitamento do meio ambiente é preciso, antes, distinguir a sustentabilidade ambiental, da econômica e da social. É quase inevitável que em um mundo neocapitalista haja a tendência de prevalecimento de uma visão na qual tudo se reduza a uma regulação de mercados, sem levar em conta a óbvia finitude dos recursos naturais. Será verdade que o desenvolvimento tecnológico, por exemplo, pode sempre encontrar soluções que evitem o esgotamento de recursos e ainda sejam economicamente viáveis? Por outro lado, cientistas sociais e políticos insistem que o engajamento social em estados democráticos pode mudar os rumos da preservação ambiental e que a ideia de sustentabilidade deve incluir pontos como educação e saúde da população. Claro está que há superposições de interesse nesses dois tipos de sustentabilidade. Também é evidente a conclusão de que a sustentabilidade ambiental é uma questão que antecede as demais e, portanto, merece toda nossa atenção. Seria possível criar indicadores razoavelmente objetivos para nortear uma sustentabilidade ambiental?
Vamos considerar o que podemos chamar de o “sistema Terra”. Ele não é isolado, como não o são os subsistemas que o compõem, pois todos trocam energia e matéria com sistemas circunvizinhos. A Terra é um sistema aberto, que permanece em estado de regime estacionário graças a um permanente contato com uma fonte externa de energia, o Sol.
A sustentabilidade de um sistema é influenciada pelo número de seus elementos e por seu regime termodinâmico, ou pelo nível de organização de seus elementos. Por outro lado, em sistemas sustentáveis, as fontes de matérias primas e energia devem ser restauradas em prazos compatíveis com os ciclos de produção.
O número de elementos e o regime termodinâmico caracterizam o que os físicos chamam de entropia do sistema, de modo que sistemas sustentáveis produzem pouca entropia e são bem organizados, enquanto sistemas insustentáveis produzem muita entropia e são caóticos. Do ponto de vista da Física, a entropia é uma função matemática que define a parte de energia inutilizável, ou seja, não transformável em trabalho mecânico. Pode-se mostrar em Termodinâmica que se a transformação é real e irreversível, a entropia total do sistema cresce sempre. Uma consequência disso, em grande escala, seria a tão propalada morte térmica do Universo, que corresponderia a um máximo da entropia do Universo, quando não seria mais possível qualquer tipo de transformação.
A fim de ordenar diferentes processos produtivos visando a um objetivo comum (produzir alimentos, construir casas, transportar pessoas, etc.) segundo a magnitude dos respectivos impactos ambientais, o engenheiro brasileiro Joaquim Francisco de Carvalho, especialista em questões energéticas, esboçou uma definição de desenvolvimento sustentável a partir de alguns conceitos fundamentais da termodinâmica. Ele define desenvolvimento sustentável, à luz da intensidade dos impactos ambientais causados pelas atividades econômicas, “como aquele que tende a manter a soma dos fluxos de entropia da produção dos sistemas terrestres próximos aos níveis dos dias atuais, pois são esses que asseguram a existência da vida na Terra”. Portanto, “desenvolvimento sustentável é aquele que não contribui para o desvio da soma de fluxos de produção de entropia pelos sistemas terrestres nos níveis atuais”. Com isso, o autor espera poder estimar uma escala de ordem de grandeza dos impactos ambientais resultantes das mais diferentes atividades econômicas. Só para dar um exemplo, em uma escala de 0 a 10, a produção hidroelétrica de energia estaria associada ao nível 1, enquanto uma usina termoelétrica queimando combustível fóssil é associada ao fator 10.
Como em tudo que diz respeito às questões ambientais, é pelo menos prudente que os políticos ouçam o que os cientistas especializados têm a nos dizer. 

Fonte: Francisco Caruso

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