O cativeiro de animais silvestres no Brasil


A maioria das infrações de fauna envolvem a manutenção em cativeiro de animais silvestres. No caso da guarda doméstica, é difícil encontrar animais silvestres adquiridos legalmente, sendo na maioria oriundos do tráfico ilegal ou capturados na natureza.
No território brasileiro são encontradas cerca de 10% de todas as espécies existentes no mundo. Passados mais de 44 anos da publicação da Lei 5.197, constatamos que ainda hoje o assunto envolvendo a guarda doméstica de animais silvestres é atual e controverso. Para se ter uma idéia, somente no Estado do Rio Grande do Sul o Ibama lavrou, no ano de 2005, 445 autos de infração relacionados à fauna (37,54% do total); em 2006, o número elevou-se para 679, correspondendo a 56,16% do total de autos lavrados; no ano seguinte (2007), foram 648 autos de infração (47,86% do total), e em 2008, uma pequena queda (479 autos de infração - 39,49% do total), mas no ano seguinte (2009), o número voltou a ser elevado (647, correspondendo a 48,98%); por fim, no ano passado (2010), houve um recorde: 750 autos de infração (57,03% do total). Ademais, desde o ano de 2009 o Ibama no Rio Grande do Sul, comparado com o Ibama dos outros Estados, é o que mais lavra autos de infração em matéria de fauna no Brasil. Considerando que cada auto de infração gera um processo administrativo, o qual normalmente passa pela Procuradoria e pela aprovação da Chefia - constatamos que a maioria das infrações de fauna envolvem a manutenção em cativeiro de animais silvestres.
Em 1945, o Departamento Nacional da Produção Animal (DNPA) da Divisão de Caça e Pesca (DCP) do Ministério da Agricultura publicou a Portaria nº 123, de 26 de março de 1945. Essa Portaria, além de autorizar a caça de determinadas espécies de mamíferos, aves e répteis, permitiu a captura para manutenção em cativeiro de vários animais, sem distinção alguma de espécie. Na época, já havia alguma proteção de determinadas espécies, como a lontra, o cervo, a anta, o lobo (guará), os tamanduás, a preguiça, a ema e bem assim todos os outros animais silvestres não indicados como caça, os quais não podiam ser caçados, capturados ou abatidos, consoante previa o artigo 2º da Portaria.
Pouco antes de completar 22 anos da publicação da Portaria nº 123, em 5 de janeiro de 1967 foi publicada a Lei 5.197/67, dispondo sobre a proteção da fauna e estabelecendo logo no primeiro artigo que os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais, são propriedades do Estado. O artigo 9º da Lei 5.197 permitiu a captura e manutenção em cativeiro de espécimes da fauna silvestre, mediante duas condições: a primeira, observar o artigo 8º [01]; e a segunda, satisfazer as exigências legais.
Em 28 de fevereiro de 1967 foi criado o precursor do Ibama, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), que competia fazer cumprir a Lei 5.197. Três meses após sua criação, o IBDF publicou a Portaria nº 3.481-DN, que apresentou uma Lista Oficial de Espécies Animais Ameaçadas de Extinção da Fauna Indígena [02], protegendo-os de modo integral e ampliando significativamente o número de espécies que não podiam ser caçadas, capturadas ou abatidas entre as quais destacamos algumas espécies de araras (arara-cinza-azulada; arara-azul-pequena e ararinha-azul) e de papagaios (papagaio-do-peito-roxo; papagaio chauá; chauá-verdadeiro; jauá; acumatanga; camutanga, chorão; chara; serrano e papagainho), os quais, antes disso, podiam ser capturados e mantidos em cativeiro com amparo na Portaria 123.
Em 17 de novembro de 1975, foi promulgada a Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagem em perigo de extinção (CITES), ocasião em que a maior parte das espécies que estavam na Lista do IBDF foram colocadas no Anexo I. Em 27 de janeiro de 1978, foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, da qual destacamos o artigo 4º, segundo o qual "cada animal que pertence a uma espécie selvagem tem o direito de viver livre no seu ambiente natural terrestre, aéreo ou aquático, e tem o direito de reproduzir-se; A privação da liberdade, ainda que para fins educativos, é contrária a esse direito" e o artigo 5º (Cada animal pertencente a uma espécie que vive habitualmente no ambiente do homem, tem o direito de viver e crescer segundo o ritmo e as condições de vida e de liberdade que são próprias a sua espécie; Toda modificação desse ritmo e dessas condições , imposta pelo homem para fins mercantis, é contrária a esse direito).
Ressalte-se que a Lei nº 5.197/67 determina que todo o animal silvestre é propriedade do Estado, sendo ilegal a posse por particulares destes animais sem origem comprovada. Para que fosse legal a posse, o animal teria de ter sido adquirido de criadouros ou de comerciantes de espécimes da fauna silvestre, regulamentados inicialmente pelo IBDF [03] e após pelo Ibama [04], havendo necessidade de apresentação da nota fiscal para comprovar a origem lícita do animal. Além disso, as araras e papagaios que não estavam na lista dos ameaçados de extinção deveriam estar devidamente anilhados, com anilha fechada, fornecida inicialmente pela Federação Ornitológica Brasileira (FOB) e após pelo Ibama, que identifica o criadouro de origem. O anilhamento só pode ser feito enquanto o animal é ainda muito pequeno. Isso representa uma garantia quanto ao fato de o animal ter nascido em cativeiro, e não ter sido capturado na natureza. Contudo, raras são as hipóteses em que a fiscalização ambiental encontra araras e papagaios devidamente anilhados, que comprovasse ter nascido o animal em criadouro regular.
A observância de restrições à posse de animais silvestres é fundamental para preservação das espécies. No caso da guarda doméstica, é difícil encontrar animais silvestres adquiridos legalmente, sendo na maioria oriundos do tráfico ilegal ou capturados na natureza, o que compromete o equilíbrio ecológico e contribui para perda de biodiversidade.
Se o animal tivesse origem lícita, por outro lado, o desequilíbrio ecológico não ocorreria, uma vez que estudos indicam que o nível de mortalidade de animais nascidos livremente na natureza é superior ao nível de mortalidade de animais nascidos nos criadouros.
Assim, a reprodução de animais ocorrida em criadouros implica um excedente populacional, o qual justifica a permissão da comercialização. No caso de animais originários de criadouros devidamente legalizados, portanto, não se vislumbra dano à biodiversidade. O mesmo não se pode falar de animais silvestres encontrados na posse de pessoas, sem a devida autorização ou licença válidas. Tal fato, grave ao meio ambiente, é atualmente tipificado como crime (art. 29 da Lei 9.605/98) e infração administrativa ambiental (Art. 24 do Decreto 6.514/08) .
A fauna é essencial à manutenção e ao equilíbrio do ecossistema, sendo responsável pela criação de um ambiente sadio, que proporcione efetiva qualidade de vida ao homem.
Combater a guarda de animais silvestres em cativeiros, por melhor que esteja a sua condição, é dever do Poder Público.
A efetividade do direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é garantida pelos órgãos ambientais através de aplicação de diversas normas ambientais, de natureza legal e infralegal, que limitam o exercício de direitos individuais em prol de um direito coletivo.

Comentários

  1. Não tem nda q eu odeie mais do que Zoológicos. Está estampado a falta de consciência.

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